domingo, 18 de março de 2012

Momento


MOMENTO


Para além de todas as descrições técnicas e científicas que o caracterizam
e definem, o momento é também de uma forma mais abstracta, o mais pequeno
espaço de tempo possível. Tão pequeno que o seu termo acontece logo a
seguir ao seu início.
Tudo o que acontece está sujeito a regras de natureza temporal. Tudo tem
um princípio e um fim, embora muitas vezes poderão não ser determinados. E
tudo existe no tempo, como existe durante determinado espaço de tempo.
Entre o princípio e o fim, tudo pode ser subdividido em espaços de tempo
mais pequenos. Por exemplo, na construção de uma casa, podemos ter como
inicio os alicerces e como fim a pintura, no entanto, o telhado, as portas, os
azulejos e a electricidade, também tiveram por si um principio e um fim. São
as partes que uma vez unidas formam o todo.
De subdivisão em subdivisão podemos atingir a divisão máxima, aquilo
que já não se pode dividir. Aquilo que do princípio ao fim forma um todo
indivisível. — Uma página escrita contém parágrafos que se dividem em frases.
Se dividirmos uma frase a meio esta deixa de o ser. Mas uma frase divide-se
em palavras. Se dividirmos uma palavra a meio esta deixa de o ser. Mas
uma palavra divide-se em letras. Se dividirmos uma letra a meio esta deixa de
ser. Mas uma letra divide-se em traços curvos e rectos. Se os dividirmos
mudam de forma e de tamanho. Passam a ser pontos e tudo o mais que a técnica
conseguir.
Cada momento é uma parte indivisível que uma vez unida aos seus pares
formam um todo, que por sua vez passa a ser novo momento e assim sucessivamente.
No mundo objectivo este funcionalismo é facilmente reconhecível porque
tudo é relativamente permanente, visível, medível e palpável. No mundo
subjectivo das ideias também facilmente se chega às mesmas conclusões —
uma história, uma recordação ou uma ideia, tem sempre uma linha de continuidade
psicológica graças à nossa capacidade de memória. Mas...
Existe um momento que é único, não se repete, não tem continuidade,
dura aproximadamente três segundos, e está presente em nós sempre que nós
sabemos que estamos presentes em algum lado: é o momento consciente.
A nossa consciência funciona em momentos de três segundos em média.
Tudo o que acontece em mais de três segundos necessita de mais momentos
de consciência, e tudo o que acontece em menos de três segundos necessita de
um momento de três segundos de consciência, ou fica desconhecido.
Tudo o que passa pela nossa consciência, quer no sentido do mundo exterior
para o cérebro (observar uma ave), quer no sentido inverso, do cérebro
para o mundo exterior (descrever a ave), passa repartido em momentos de três
segundos.
Este espaço de tempo é o exigido pela nossa natureza para que o nosso
cérebro seja capaz de registar ou produzir conscientemente qualquer dado. É o
tempo necessário para que qualquer som, imagem, cheiro, etc; viaje desde a
recepção pelos órgãos sensores do corpo — olhos, ouvidos, etc. — até que
sejam gravados na memória, ou inversamente, desde que qualquer ideia seja
produzida no cérebro até ser exteriorizada por palavras ou actos.
Exceptuando as horas em que dormimos e as horas em que por doença ou
acidente ficamos inconscientes, toda a nossa vida em que estamos vigilantes, é
uma continuidade de momentos conscientes. Momentos que podem existir
singularmente, quando apenas registamos um dado (um toque de campainha
de porta, por exemplo), ou agrupados em ordem cronológica e de significados,
formando as ideias.
Por exemplo, para o leitor conseguir compreender estas linhas, terá que ir
dividindo as palavras em grupos, de forma a avançar para o grupo seguinte
apenas quando tiver memorizado — ou consciencializado, ou compreendido
— o grupo anterior. Devido a essa necessidade, é que a linguagem, quer escrita
quer falada, obedece a regras de pausa — pontos e vírgulas, etc. Mas, se
durante a leitura deste texto, algo exterior acontecer (o bater de uma porta, por
exemplo), só podem acontecer duas coisas: ou o leitor interrompe a leitura e
usa pelo menos um momento (aproximadamente 3 segundos) para registar na
memória esse facto de uma forma consciente, ou continua a leitura sem registar
conscientemente esse facto. Mas neste caso, se não usar um momento após
a leitura para registar o facto que ainda está semiconsciente, o mesmo ficará
registado apenas inconscientemente. E o leitor ficará confuso ao reparar que a
porta antes aberta se encontrava depois fechada.
Porque cada momento consciente necessita de três segundos, e em três
segundos podem acontecer à nossa volta uma infinidade de acontecimentos
simultaneamente. Apenas consciencializamos um. Mas inconscientemente
todos ficam registados, e, só num acesso ao inconsciente (sonhos, êxtase, delírios,
etc.), os podemos rever, e podemos ou não trazer ao consciente conforme
a sua sincronia com este. Pois o inconsciente funciona aleatória e expansivamente,
enquanto que o consciente funciona lógica, racional e ordenadamente.
Quando nada acontece, como o nosso cérebro não pára, registará momentos
de imaginação e fantasia, ou de apatia e nulidade, conforme a estimulação.
A falta de informação forma um cérebro incompleto e o excesso de informação
forma um cérebro confuso. A cada um caberá saber a quantidade de
informação necessária para que o seu cérebro funcione em equilíbrio, porque
cada momento consciente é temporalmente relativo a cada cérebro conforme
as capacidades neuro-bio-psicológicas.